segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Comentário geral

Pro dia nascer feliz – uma interpretação possível          
Ou Clareando para uma Rio Claro mais clara

Inicio essa escrita com a justa despretensão de alguém posto à reflexão. Despretensão sim, pois não ambicionamos aqui explanar nem relacionar teorias científicas ligadas ao conhecimento social ou educativo produzidos academicamente. Devo contudo, contextualizar o leitor sobre qual o objeto de nossa reflexão, cujo ponto de partida é a produção de  um  documentário brasileiro que,  através de um trajeto realizado por diversas cidades e estados apresenta ao espectador as múltiplas faces da educação no Brasil.
O filme tem início numa escola estadual localizada no município de Mandari, estado de Pernambuco, considerado o mais pobre do país. As imagens revelam além da pobreza do lugar, a precariedade da educação em todos os níveis (infra-estrutura da escola, escassez de material didático, longa distância percorrida pelos alunos para poder assistir às aulas, falta constante de professores etc).
A segunda escola visitada pela equipe de produção do documentário localiza-se no município de Duque de Caxias (Baixada Fluminense), no estado do Rio de Janeiro. A situação da escola é também de bastante precariedade incluindo alto índice de violência entre os estudantes, alguns sob a influência de “rodas de amigos” (narcotráfico, baile funk etc). Nesta escola, é mostrada a importância de projetos sócio-culturais na formação dos alunos, principalmente no resgate de sua cidadania. Após, é visitada uma escola em Itaquaquecetuba, estado de São Paulo, em condições muito parecidas com as das anteriores, e em seguida, temos a visita ao Colégio Santa Cruz, localizado no bairro Alto de Pinheiros de classe média alta, que assegura aos alunos um ensino propedêutico de altíssima qualidade, com um corpo de professores muito bem preparados, além de excelente infra-estrutura do prédio, salas e pátio. Vale lembrar que nesse colégio os alunos desfrutam de uma gama diversa de cursos “extra-curriculares” de áreas diversas como: teatro, música, artes plásticas e esportes.
É inútil frisar a questão da desigualdade social, assim como o problema da “falta de oportunidades” que desde longa data em nossa história teima em assombrar os pobres ficando a equidade social um sonho cada vez mais distante ainda mais em tempos de globalização e desenfreadas ações neoliberais, cujas diretrizes norteiam as políticas públicas sociais dos governos de todo o mundo ou de quase todo.
Agora lanço a provocação: será mesmo que “projetos sócio-educativos” como acontece na escola em Duque de Caxias, como mostrado no documentário, dão conta da problemática social? Não. Não dão. Mas é preciso que existam, aos milhares e em todos os lugares, cada vez mais, não nos resta dúvida, porém o problema da desigualdade social é muito sério e exige intenso trabalho, não só nas comunidades carentes diretamente, mas também e, sobretudo, na estrutura política e ideológica em que se assenta a história das lideranças políticas de nosso país. Lideranças  políticas permitirão que seja implantado um projeto de capoeira ou hip-hop num bairro de periferia qualquer de olho nas reeleições. Mas será que permitirão e darão estrutura para algo diferente ao já conhecido pelo povo? Rap e hip-hop num bairro de periferia é bacana, todo mundo gosta. O povo vai ao delírio, ok. Mas porque não pensar na Orquestra Sinfônica do município realizando um concerto em praça pública no meio da periferia? Assim como os grupos de hip-hop, por outro lado, porque não apresentar seus ritmos e cultura urbana aos alunos dos melhores colégios?
Resumo: isso não acontece. O que é do gueto fica no gueto e não sai de lá. Ninguém pode chegar lá, a não ser os “esfarrapados e condenados da terra” para lembrar Paulo Freire. Duvida? Experimente um dia desses qualquer dar um passeio “turístico” por Rio Claro. Você vai ver que Casarão da Cultura, o Fórum, as agências bancárias, o melhor do comércio, os restaurantes, casarões e monumentos históricos localizam-se num restrito e pequeno miolo municipal chamado “centro”. No entorno temos os bairros onde reside a classe média e alguns pouquíssimos bairros onde habita a elite efetivamente. Se entra e se sai de Rio Claro passando tranquilamente por esses principais pontos. Mas e o povo sofrido, trabalhador, sem registro, sem dentista, sem escola, sem parque, sem saúde, aquele que sobrevive por pura teimosia ? O povo está longe, afastado, na periferia da periferia. Isto é, qualquer idiota pode crer ingenuamente que em Rio Claro, por exemplo, não há pobreza. Ilusão ou ignorância? Ela está escondida nos arredores da cidade, esquecida, abandonada à própria sorte. Os nomes são vários: Batovi, Assistência, Mãe Preta, Pé no Chão, Jardim Novo I, Guanabara, São Miguel, Cervezão, São Jorge, São José, Esteca, Novo Wenzel, Ferraz, Ajapi etc etc etc.
Em suma, não bastam projetos sociais de “inclusão”, pois nenhum ser humano por mais projetos que esteja incluído, não aprenderá jamais (e graças a Deus) a conviver com a fome, a sujeira, a miséria, a violência, preconceito e a indiferença.

Por Alyne Arins